quinta-feira, 22 de março de 2012

Crise da Esperança e Barbárie Cultural

Temos assistido nos últimos tempos a um estado de constante insegurança seja a nível econômico que humano. A crise de valores já insinuada nos albores do séc. XX e consolidada nas últimas décadas do mesmo século vive hodiernamente a fase sucessiva: a dissolução da esperança.
O termo "esperança" é muito poluído devido à banalização de seu uso, chegando a uma compreensão quase ingênua e, predominantemente, comodista, do modo de pôr-se diante de uma situação crítica. Esperança, porém, deve ser compreendida como aquela capacidade humana de resignação e de confiança que valoriza o potencial do ser humano de superar os seus limites e de transformar a realidade elevando-a a patamares mais altos de justiça e equidade. É a fé incondicional e indiscriminada no potencial humano que torna possível com que cada pessoa humana possa ensimesmar-se com a humanidade inteira. Em termos cristãos poderíamos dizer que a esperança é a condição "sine qua non" da solidariedade e do amor ao próximo.
A crise desta fé, desta paixão pelo humano, produz o contrário da esperança, conduzindo à uma situação de desconfiança e de discriminação entre "humanidade credível/salvável" e "humanidade desacreditada/perdida", onde a sobrevivência da primeira exige a destruição da segunda.
O filósofo francês Edgar Morin em recente entrevista ao jornal espanhol "El país", comentando o movimento "los indignados" dizia que este é uma reação a esta crise de esperança que gera uma situação de barbárie, onde a falta de confiança nos modelos culturais vigentes desencadeia uma violenta reação contra os seus sustentadores; o grande problema, segundo Morin, é que los indignados "fazem críticas justas, denunciam, mas não podem anunciar". Não podem anunciar justamente porque não acreditam mais nos valores que fundamentaram a sociedade nascida com a democracia e os governos liberais. A democracia deixa cada vez mais de ser a garantia do poder do povo para ser instrumento de ascensão de quem detém os mais sofisticados meios de publicidade e de manipulação das massas, por outro lado os governos liberais se tornaram "covis" que abrigam os mais diversos tipos de corruptos e de gatunos parasitas do dinheiro público, demolindo portanto a esperança da juventude cada vez mais abandonada à própria sorte, devendo lutar pela sobrevivência em um mundo desprovido de valores e de princípios morais claros. Los indignados são o sintoma mais ameno desta situação de barbárie, pois aquele mais perigoso e mais cruel é justamente o assassinato da esperança no coração do homem impedindo-lhe de acreditar em seu futuro, destruindo a humanidade nas suas raízes mais profundas.
A este ponto de nossa reflexão o leitor deve considerar a nossa reflexão por demais pessimista, porém, cremos firmemente que a situação de barbárie atual coloca o home diante de escolhas fundamentais que determinarão o futuro da humanidade e a manutenção da própria vida na Terra.
Urge uma reelaboração dos valores humanos fundamentais, um renascimento da esperança, uma redescoberta do potencial moral humano, uma conscientização acerca do risco ecológico, enfim, uma reeducação acerca da complexidade da existência, da interdependência radical entre as diversas facetas da vida, da cultura e do poder, recobrando a "unidade diversificada" que permite a sobrevivência pacífica e a supremacia da solidariedade e da comunhão. Tal empreendimento é um dever de toda a sociedade, sobretudo recai como uma obrigação daqueles homens e daquelas instituições responsáveis pela formação das consciências e pela emolduração teórica das culturas, como as instituições religiosas, educacionais e familiar.
Aos ouvidos dos cristãos ressoa sobretudo o chamado de Cristo ao testemunho; ao silencioso grito transformador do testemunho que é capaz de abrir os ouvidos aos surdos, fazer ver aos cegos e falar aos mudos e, principalmente, calar a voz dos "espíritos imundos" que submetem o homem à escravidão da alma e condena à morte a esperança no tribunal do coração dos jovens.

Pe. Edson Bantim
Roma-It, 22/03/2012