terça-feira, 14 de junho de 2011

Amou-nos até o fim!

“Tendo amado os seus, amou-os até o extremo” (Jo 13, 1b) As palavras do Evangelista João, ao iniciar o relato do lava-pés, nos ajudam a compreender o mistério que  celebramos na sexta-feira da paixão. A morte do Senhor nos causa, simultaneamente, espanto e encanto. Espantoso é o amor que sem nada receber de prêmio tudo entrega ao ser amado. Espantoso é o Rei e Senhor que morre para que vivam os escravos. Espantoso é o Deus que se permite “humilhar-se até à morte e morte de cruz” (Fl 2,8) a fim de que vivam suas criaturas.
Encantador é o coração que se deixa rasgar pela lança da ingratidão e do ódio a fim de fazer jorrar para seu algoz a fonte de vida eterna. Encantadoras são a coragem e a liberdade de quem não poupa a própria vida para defender quem ama.
Sem dúvidas celebramos hoje a solenidade do mais Belo Amor.
A morte de Jesus Cristo é um poema de amor à humanidade. Quem poderia resistir àquele canto iniciado às três da tarde daquela sexta-feira? Como esconder-se para não ouvi-lo? “Seu som ressoa em toda a terra, por todo canto se escuta a sua voz”(Sl 18). O aparente silêncio da morte se torna um grito aterrador que invade os ouvidos de homens e mulheres e atinge o mais profundo de seus corações.
Diante do Senhor, aparentemente vencido, contemplamos a vitória da humildade sobre o orgulho, do amor sobre o ódio, da doação sobre o egoísmo, e, contraditoriamente, da vida sobre a morte.
Contemplamos o caminho descendente do amor de Deus. Descendo ao mais profundo, foi elevado ao mais alto.
Vindo a nós, Ele, Luz Verdadeira, quis iluminar todos os recônditos de nossa vida, desde as alegrias das nossas festas (Cf. Jo 2,1ss) à escuridão de nossa morte. O Senhor da vida desce à mansão dos mortos e lhes garante a salvação. Assim, “o Justo que morre condena os ímpios que vivem” (Sb 4,16) “As multidões vêem, mas não entendem, nada disso lhes ocorre a mente: que graça e misericórdia são para seus eleitos e sua visita para seus santos” (Sb 4, 15).
O testemunho de amor de Cristo nos arrasta, nos constrange ao abandono de nossas vidas em suas mãos. Ao amor que arrasta, disse o místico São João da Cruz, não se pergunta aonde vai. “Quando eu for elevado da terra atrairei todos a mim” (Jo 12 32). A cruz de Cristo nos atrai a todos. É o sinal da nossa redenção, é o sinal do Amor de Deus por nós.
Quem poderia resistir a esse amor? Que coração resistiria a tamanha doação? Que prova maior necessitamos do amor de Deus? Como não se sentir constrangidos a amar diante da cruz do Senhor?
Jesus descido da cruz, morto diante de nossos olhos revela o tremendo mistério do coração de Deus, de seu amor e de sua fidelidade. “Passei junto de ti e ti vi. Era o teu tempo, o tempo dos teus amores, e estendi a aba de minha capa sobre ti e ocultei a tua nudez; comprometi-me contigo por juramento e fiz aliança contigo te tornaste minha. (Ez 16,8). Já a esposa encontra-se diante do sepulcro do esposo. É hora de contemplar a fidelidade do noivo. É hora de se deixar renovar pelas lágrimas que sinalizam nossa infidelidade denunciada pelo Cristo morto ante os nossos olhos.
A Igreja, ao celebrar a morte de Jesus Cristo a cada ano é chamada a mergulhar novamente na chaga de Seu coração traspassado e, entrando com ele no túmulo, sair de lá renovada, pura, sem mancha nem ruga para ser apresentada ao Pai no Dia que o Senhor fez (Cf. Ef 5, 27).
Olhar para o Senhor morto nos constrange a todos a sermos testemunhas de seu amor, mensageiros de sua entrega, missionários de sua fidelidade, discípulos, aprendizes de seu jeito de amar.
O verdadeiro discípulo traz em sua vida as marcas profundas de seu Mestre. A marca de Cristo é seu testemunho extremo de amor. “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15, 13). “Nisto reconhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13, 35).
Deixemo-nos, pois, embeber por este amor, deixemos que a seiva desta Vide, à qual estamos ligados como ramos, corra por nossas veias a fim de que produzamos saborosos frutos de vida e salvação para o mundo. “Meu Pai é glorificado, diz Jesus, quando produzis frutos e vos tornais meus discípulos” (Jo 15, 8).
Contemplemos Jesus diante de nós e não sejamos insensíveis a seu amor. Que não se endureça o nosso coração. Permitamos que também nosso coração seja rasgado por Deus, invadido por sua graça, transformado por seu amor incondicional. Aproximemo-nos do Senhor com os corações ajoelhados. Imitemos o seu exemplo. Ouçamos mais uma vez a canção de amor cantada pelo silêncio de sua morte. A melodia de sua entrega acalenta as nossas dores, sara nossas chagas, nos dá um coração novo. Deixemos que se escreva em nossa vida a letra desta música. Sejamos fiéis. Permaneçamos no seu amor (Cf. Jo 15, 9b).
Pe. Edson Bantim
Roma-It, 14/06/2011

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