quinta-feira, 16 de junho de 2011

Deus é Cantador (Domingo da Santíssima Trindade)

Igreja da Transfiguração no Monte Tabor

Ao entardecer, o crepúsculo faz descer o seu véu colorido sobre o céu como que a preparar o repouso diário do astro rei. Nesta mesma hora, em um pequeno casebre, no tórrido sertão nordestino, um senhor de barbas brancas, rugas na testa e mãos calejadas toma rua rabeca, senta-se no alpendre da casa tendo ao redor  sua família e começa a entoar aquela velha canção que aprendeu ainda pequeno e que, mesmo antiga, nos ouvidos dos que ama parece ser sempre nova. Voz turva, dedilhado forte, expressões aparentemente rudes e um coração cheio de amor. Enquanto canta, escapa de seus olhos uma lágrima teimosa que desce queimando e seu rosto já marcado pelo calor do sol. Lá dentro seu coração, silencioso, guarda o motivo da lágrima, da canção, do olhar distante.
Ao contemplar esta cena penso em Deus. Vejo-o sentar-se na varanda de cada casa, a entoar velhas canções e a se emocionar com as lágrimas de seus filhos. Vejo Deus Conosco, a se fazer peregrino em nossos caminhos, a nos mostrar a via descendente que nos conduz à verdadeira grandeza, a sorrir com cada homem e mulher, com cada criança e ancião, a chorar em cada recanto do mundo com os que foram privados da tapera, da família, da canção e para quem o crepúsculo se reveste de tristeza. Então penso Deus em nós, que nos lança em direção dos pequenos, que nos dá a possibilidade de transformar-lhes a vida, que nos ensina sobre a canção, sobre o colorido do entardecer, sobre o Cantador sentado ao alpendre, sobre o peregrino que nos acompanha e sobre nós mesmos nesta história.
Deus é Cantador. Também ele no crepúsculo da história humana, quando as cores do entardecer dão lugar a escura noite, constrói sua tapera entre as nossas (Jo 1,14), senta-se (Jo 4,6b) no alpendre de nossos corações e nos ensina a canção do amor que liberta de toda escravidão. Enfim, quando cansados e fatigados pelas vicissitudes de nossa história e tremulam as velhas paredes de nossos casebres ele vem e faz morada em nós, nos faz ouvir a velha canção, admirar o entardecer, verter a lágrima que lava a alma e a compreender, por sua companhia, que Deus, para tanto amar, não podia ser só. Ele é Letra e Música e Cantador.
Pe. Edson Bantim
Roma-It, 16/06/2011

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